Entrevista: JP Narciso Luciano – Orientador e encenador do espectáculo das Janeiras no Teatro Municipal da Guarda
Jorge Pedro Narciso Luciano, orientador e encenador do espectáculo das Janeiras que vai decorrer este sábado, 6 de Janeiro, no Teatro Municipal da Guarda, é natural do Paul, concelho da Covilhã.
Estudou na Covilhã, em Barcelona e no Porto. Actualmente está a fazer mestrado em Lisboa, no ISCTE, em Estudos e Gestão da Cultura.
É dirigente associativo, dedica à associação a maior parte do tempo extra profissional. Gosta muito de tecelagem e artes manuais ligadas ao têxtil e de passar tempo no jardim/horta.
A GUARDA: Está a preparar o espectáculo das janeiras que vai ser apresentado no Teatro Municipal da Guarda, no dia 6 de Janeiro. O que o levou a aceitar o convite para fazer esta encenação?
JP Luciano: O meu trabalho artístico está ligado à comunidade, à criação participativa com as pessoas, e ao seu património e identidade, esteja ele vivo ou inactivo. Quando comecei a explorar a região da Guarda, por causa de um trabalho cinematográfico ligado ao saber fazer, percebi que há uma riqueza muito importante, que me fez não só estabelecer-me aqui mas também ter interesse em querer desenvolver trabalho artístico e de mediação. Aceitar o convite vem trazer-me dois desafios pessoais: estrear-me como encenador numa sala de teatro (as outras obras de direcção artística foram no espaço público, ao ar livre) e possibilitar-me continuar a conhecer a comunidade viva da Guarda.
A GUARDA: Já conhecia as Janeiras dos grupos do concelho da Guarda ou foi necessário fazer algum trabalho prévio?
JP Luciano: Já conhecia o conceito e vi também um dos espectáculos finais, penso que em 2018.
A GUARDA: Teve oportunidade de participar nos ensaios individuais de cada grupo?
JP Luciano: Sim, fui visitar todos os grupos, as suas sedes e locais de encontro, e fui muito bem recebido. Com alguns ainda cantei o repertório deles, para além de conversarmos sobre o espectáculo e sobre a história do grupo e do território.
A GUARDA: Como delineou o guião que serve de fio condutor ao que vai ser apresentado no Grande Auditório do TMG?
JP Luciano: Vamos contar uma história, a viagem de uma música típica da tradição de cantar as Janeiras, desde a sua origem centenária até ao lugar contemporâneo de hoje. Esta história vai ser contada através da música, sem palavras, só com melodia. O património imaterial é um dos focos do meu trabalho, proteger este legado que pode desaparecer com o tempo das pessoas e fomentar a criação artística do passado no nosso espaço presente.
A GUARDA: Qual a grande novidade no espectáculo deste ano?
JP Luciano: Penso que os designers que convidei: um desenhador de luz, para criar o ambiente cénico do palco; uma desenhadora de figurinos, para as personagens principais do conto; e uma desenhadora gráfica, para transformar a folha de sala. Estes desenhos ajudam a contar a história. Fazem parte da dramaturgia do espectáculo.
A GUARDA: No conjunto o espectáculo envolve mais de 400 pessoas. É difícil coordenar tanta gente em palco?
JP Luciano: Na verdade, imaginei que fosse mais complicado a coordenação colectiva, especialmente nos ensaios, actuando em cena no palco ou à espera da sua vez no público. Enquanto visitava os grupos, depois de ter já o guião da dramaturgia, pensei que seria difícil o encontro de todos, para materializarmos as ideias. E foi uma surpresa, ver a intenção dos participantes em colaborar com a ordem do ensaio, em perceber o conceito do espectáculo e em fazerem parte da criação, que também inclui as interpretações de cada um deles. Há tendência para o caos, é a naturalidade do colectivo que se conhece entre si, e, sobretudo, de um colectivo vivo (estes participantes fazem espectáculos, dinamizam os seus territórios e os vizinhos, contribuem para as tradições e para o seu vernáculo, …). Contudo, coube também o respeito pela coordenação e pelo processo participativo.
A GUARDA: Trabalha com o Laboratório Criativo Maria Zimbro desde 2017, na implementação de projectos ligados ao património imaterial e a criação e mediação comunitária. Como e onde é desenvolvido este trabalho?
JP Luciano: Como colectivo começámos por desenvolver um trabalho de recolha e registo do património oral no Paul, onde nasci e onde tenho ligações inquebráveis. Daí, fomos convidados a desenvolver esta ideia em projectos já sustentados, como o Aldear (Tâmega e Sousa) ou o Cultura em Expansão (Porto). Também decidimos desenvolver o mesmo projecto em outros territórios através dos apoios nacionais às artes, como no Fundão, onde trabalhamos ainda a comunidade e o seu espólio de estórias.