Entrevista: António Manuel Saraiva – Arquitecto
António Manuel Saraiva é arquitecto, na Guarda. É autor da peça que foi criada e desenvolvida para dar início às comemorações dos 50 anos, distinguindo as personalidades que fazem parte da Comissão de honra e executiva dessas comemorações. Também é um apaixonado pela medalhística, tendo já desenvolvido cerca de 50 medalhas.
Estudou na Escola Superior de Belas Artes do Porto e Faculdade de Arquitectura de Lisboa. Ocupa os tempos livres nas artes plásticas e criatividade e inovações.
A GUARDA: No dia 25 de Abril apresentou mais uma peça escultórica, desta vez comemorativa 25 de Abril. O que é que o levou a criar esta peça?
António Saraiva: A peça apresentada deve-se a um desafio lançado pelo executivo municipal, nomeadamente pela pessoa do senhor presidente Sérgio Costa. O 25 de Abril é um tema sobre o qual já vinha a desenvolver vários estudos e ideias e como tal este desafio foi como que um desenvolvimento, uma continuidade.
A GUARDA: Uma verdadeira alusão ao poder local e á liberdade?
António Saraiva: Sem dúvida. Desde a forma, aos materiais utilizados e à simbologia aí vertida remetem-nos para o verdadeiro espírito e conquistas de Abril de 74. Estas referências pretendem contribuir para o relembrar dessas conquistas e despertar os mais novos para a importância que foi Portugal passar a viver um estado de direito, de liberdade, em democracia plena.
No entanto, também esta peça se apresenta incompleta no que respeita à forma cúbica que referencia o novo estado social por forma a lembrar-nos que todos nós somos responsáveis por contribuir para o amadurecimento e aperfeiçoamento desta democracia.
Para quem não viveu o antes e o depois de Abril pode ter a tendência a menosprezar o que é viver em liberdade.
Liberdade que, no entanto, também nos exige responsabilidades e contributos para que tenhamos plena efetividade de direitos.
A GUARDA: É um projecto que pode evoluir para monumento escultórico?
António Saraiva: Não. Esta peça foi criada e desenvolvida especificamente para dar início às comemorações dos 50 anos, distinguindo as personalidades que fazem parte da Comissão de honra e executiva dessas comemorações numa reconhecida iniciativa por parte da autarquia. Como tal, as 80 peças, devidamente numeradas, são únicas e ficarão como marca do início de um desafio que todos queremos que seja diferente e único.
A GUARDA: A Guarda vai ter uma peça da sua autoria para assinalar os 50 anos do 25 de Abril?
António Saraiva: Gostaria. No entanto essa questão terá que ser colocada às devidas instâncias e a quem de direito. Posso, no entanto, adiantar-lhe que há desafios e propostas. O futuro, curto, o dirá.
A GUARDA: A criação de peças escultóricas é uma das suas principais marcas. Para além da Guarda onde é que podemos encontrar esculturas/monumentos da sua autoria?
António Saraiva: Para além das esculturas existentes na nossa cidade da Guarda das quais destacaria o mural ‘Ciclo da Vida’ na entrada do edifício das consultas externas do Hospital Souza Martins, do monumento aos Combatentes no Ultramar e do memorial às vítimas de Cancro, tive a oportunidade de deixar também já a marca da Guarda na cidade de Pinhel com o monumento aos Combatentes do Ultramar, na cidade da Covilhã com o monumento ao Escutismo, em Oliveira do Hospital numa homenagem às Mães e na cidade Newark, estado de New Jersey/ EUA num monumento aos soldados luso-americanos e que foi objecto de concurso internacional.
A GUARDA: Ainda se lembra da primeira peça escultórica que desenhou?
António Saraiva: Diria que a primeira peça escultórica terá sido a concepção para a Rádio F, em 1996, do troféu “Personalidade do Ano”.
No entanto, já no ano de 1990 tinha desenvolvido a minha primeira medalha comemorativa a pedido do Dr. Virgílio Ardérius como pároco da Sé da Guarda e aos 600 anos desse templo. A medalhística tem sido um dos meus hobbies, contando com cerca de 50 medalhas com a minha assinatura e carolice.
Mas se o 25 de Abril de 74 abriu múltiplas portas e oportunidades, o campo artístico foi precisamente um dos que muito ganhou. Na Guarda, em 1975, ganhava corpo o Primeiro Salão Primavera de Artes Plásticas e no qual tive oportunidade de participar com apenas 13 anos. Nessa altura mais virado para a pintura. Como a vida de então não era fácil expusemos dois colegas sob um só pseudónimo e mesmo assim com uma atenção especial por parte da organização que nos reduziu o valor da inscrição. Já agora e ainda a título de curiosidade e das dificuldades da época, levava-nos a recorrer a platex, derivado de madeira e que tem numa das superfícies uma textura característica para substituir a tela já que esta era caríssima para as nossas possibilidades. Era sobre essas placas que conseguíamos junto das carpintarias, que aplicávamos as tintas de óleo.
Nessa altura os artistas plásticos conseguiram criar um atelier coletivo que funcionava numa das salas do piso zero do Paço da cultura. Os artistas, na maioria amadores, com o 25 de Abril puderam mostrar a suas criações e dar corpo às suas obras sem censura e opressão. Permitam-me que aqui deixe uma referência a alguns dos muitos que por esse espaço passaram e dinamizaram e que levaram o nome da Guarda além fronteiras e que no meu caso me apoiaram e incentivaram. O Luís Rebelo, o Carreto, o Brigas, o Oliveira,…
Gente a quem a Guarda deve estar agradecida e reconhecer. Porque não para o 25 de Abril de 2024 a Guarda perpetuar estes e outros nomes numa galeria de artistas guardenses? A eles o meu Bem Haja.
A GUARDA: Qual a peça que ainda gostava de desenhar para a Guarda?
António Saraiva: Como quando sonhamos não temos de ser modestos, eu não diria uma mas sim três e porque todas elas me dizem muito enquanto temática, cidade e em ligações pessoais. Desde logo o monumento aos 50 anos do 25 de Abril, o monumento aos nossos Bombeiros aquando dos 150 anos da corporação e ao anjo da guarda embora existindo já uma excelente obra representando esta figura única e identitária da cidade da Guarda.
A GUARDA: É importante apostar neste tipo de arte para assinalar datas e acontecimentos marcantes da vida dos povos e comunidades?
António Saraiva: Sem dúvida. A arte possibilita dar a conhecer e perpetuar os acontecimentos que marcam a história dos nossos territórios, das nossas gentes e cultura para além de contribuir para a humanização do espaço público. É o perpetuar e não deixar esquecer e simultaneamente estar a contribuir para a valorização do Património cultural e artístico para além de que se o elemento escultórico for diferente, distinto e cativante com certeza que levará o nome da localidade onde estiver pelo mundo fora através da memória e das objetivas dos visitantes.