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Tempo de férias – À descoberta da fronteira espanhola

Viver na raia é ter a oportunidade de conhecer também a parte espanhola.

Atravessar a fronteira é um gesto que nos é habitual. Ali, a dois passos das nossas aldeias, há vestígios de um passado histórico que merecem a nossa curiosidade. Aqueles que já passaram para lá de Valverde del Fresno, aperceberam-se que em muitas aldeias e vilas há catedrais e igrejas, a maior parte delas inacabadas, como por exemplo, em Guinaldo, Gata, Hoyos e mesmo em Valverde del Fresno. É que, na mesma altura em estes edifícios se construíam, Filipe III de Espanha queria também terminar o Escorial e, por isso, requisitou todos os pedreiros da região. Ficaram assim igrejas e palácios inacabados para sempre.
É também necessário lembrar que estamos perto de uma região que foi terra de acolhimento para os judeus expulsos de Espanha, em 1492, pelos Reis Católicos, e que se refugiaram a dois passos de nós, deixando-nos um valioso património arquitetónico em terras como Plasência, Bejar, Hervas, La Alberca… que hoje nos encantam.
Antes da vinda dos judeus, já lá se encontravam os árabes que ali deixaram alguns vestígios visíveis, com os castelos de Eljas e Santibanhez, estrategicamente necessários à defesa da Serra da Gata. Estas duas comunidades coexistiram pacificamente durante séculos, até serem assimilados pelas populações locais.
Mais tarde, foi a vez dos conquistadores que, oriundos desta mesma região, regressaram do Perú e do México sem saber muito bem o que haviam de fazer com tanto ouro e prata que traziam daquelas paragens. Embriagados com tanta riqueza puseram-se a construir igrejas para a maior glória de Deus e belos palácios para a posteridade que ainda hoje podemos admirar em Hoyos, Coria, Cáceres, Placência e mais a norte, na austera, mas encantadora Ciudad Rodrigo.
A natureza também dotou esta região de uma beleza ímpar. Não longe da Ciudad Rodrigo, encontra-se a Sierra de Francia, composta por um rosário de aldeia típicas. A Penha de Francia é um rochedo íngreme, de 1.800 metros de altitude, com um soberbo miradouro e um hospitalar convento de dominicanos. É de la que se tem a melhor vista da Serra das Hurdes. E o cineasta Buñuel imortalizou nos anos 30 esta região com o seu filme “Hurdes Tierra sin Pan”. Aqui, os camponeses eram obrigados a irem buscar terra aos vales para a depositarem em socalcos onde eram feitos os cultivos, tão exígua e rara era a terra arável, como podres e inóspitas eram as aldeias que habitavam.
Um pouco ao norte das Hurdes, é digno de admiração o Parque Natural de las Batuecas de que Miguel de Unamuno já dizia que as mesmas eram um jardim botânico abandonado. Também a sul de Plasência, o Parque Natural de Monfrague abriga, nos seus 20 mil hectares, terras selvagens onde se reproduzem mais de duzentas espécies raras de vertebrados, tais como o falcão peregrino, a cegonha preta, o lince, a abetarda negra, a águia imperial ibérica, etc.
E não se diga: “aí está mais um português que vendeu a sua alma à Espanha”. Não. O bairrismo e o nacionalismo foram, em seu tempo, bem necessários para o crescimento histórico do povo português, face a uma Espanha ávida de conquistas territoriais. Felizmente, esses tempos já passaram e não há sombra de dúvida que os raianos beirões, os primeiros a ultrapassarem esses preconceitos, foram os pioneiros da necessária construção da Europa, com o constante “salto” que foram obrigados a dar até terras desconhecidas, mas que hoje vemos, orgulhosamente, os seus descendentes e amigos que se encantam com um Portugal que, em seu tempo, lhes deu com os pés.

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