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Prenúncios da velhice

Eu cheguei a este Mundo no último dia do penúltimo mês, do derradeiro ano da primeira metade do século vinte. Por motivos que então eram permitidos, só me deram entrada no segundo dia do primeiro mês da segunda metade do mesmo século.
Há quem me diga que sou mais novo um ano, todavia eu discordo, pois os dias contados, ou não contados já os tenho cá no corpo. Também tenho que reconhecer que esta alteração no registo me veio a beneficiar no serviço militar obrigatório, uma vez que o vinte e cinco de abril aconteceu comigo na tropa, logo me permitiu sair sete meses mais cedo. Se tivesse sido incorporado um ano antes, já isso não acontecia.
Serve este intróito, para vos dizer que já navego na velhice, pelo que vou sentindo o seu peso nos ossos e nos músculos, além de outras doenças que no meu corpo se foram alojando.
Eu costumo dizer que só dos olhos para cima me sinto bem, pois daí para baixo já tudo fracassou. O que mais me estorva é a falta de mobilidade, pois cheguei ao ponto de poder dizer que as pernas já mal me podem com o corpo. É uma das coisas que mais me transtorna, pois uma deslocação apeada, ainda que em terreno plano, para lá dos cem metros já se torna um berbicacho.
Aos outros achaques com medicação mais ou menos controlada, eu vou resistindo, embora aqui e ali sinta os seus efeitos, não são dolorosos nem me obrigam a um repentino descanso.
No meu entender o ser humano, também se vai abaixo por um dos dois polos, ou pelas pernas ou pela cabeça, pela minha análise entendo que começar pelas pernas é um mal menor. Pois se a cabeça avariar, é que o caldo fica de todo entornado. Aqui apetece-me recorrer a uma sentença da sabedoria popular que deste modo se expressa.- Uma mãe faz muita falta, mas o tino?
É na cabeça que temos o comando de todo o nosso corpo, daí saem todas as ordens para que o corpo execute. É certo e sabido que tudo isto obriga-nos a um certo cuidado que tem de evoluir proporcionalmente com a idade. No meu caso e relativamente à franqueza que me é conhecida, digo-vos que caio no descuido com muita frequência, pois sem dar por isso, lá estou eu a meter o pé na argola.
Por entre as cautelas e desleixos que me são característicos cá vou eu derreado de todo a subir a última montanha. Aqui e ali vou contando as pequenas avarias que a “máquina” me vai mostrando. Algumas, eu vou reparando, outras vão ficando e evoluindo, pois só irão desaparecer com o dono. Também sei que por aquilo que a medicina me vai transmitindo não vou ser um idoso de idade muito prolongada, pois os médicos vão contando os anos sobre os tratamentos e já vão considerando a conta muito razoável.
Também encaro a partida com toda a naturalidade, pois embora goste muito de cá andar, sei que todos nós temos um tempo certo para viajar na vida. Quando essa viajem chegar ao ponto final, todas as moléstias acabaram e transitaremos para o sempre desejado eterno descanso.
Espero que alguém valorize o bem que fui praticando e me desculpem o mal se por ventura alguém se sentir ofendido, mas que em consciência vos garanto que não foi com dolo que qualquer ato desses por mim foi levado a cabo.
Possivelmente estou numa hora de pensamentos negativos, pode até o resto da minha vida nem ser tão curto como eu o estou a pintar, mas por aquilo que eu propriamente sinto e pelos elementos que vou recolhendo, não estou em condições de pensar de outra maneira.
Por outro lado, também posso dizer que me sinto feliz por chegar a “velho”, termo que eu gosto de ouvir quando alguém se me dirige, pois muitos do meu tempo já não moram entre nós.
Depois destas minhas lamentações é tempo de ficar por aqui. Todos temos que esperar pelo tempo que nos resta, gozado com alegria e dentro da saúde possível.
Vamos todos ter esperança e convictos de que essa será a última a morrer.
Espero estar aqui doze de setembro se a saúde me não abandonar.
Um abraço para todos vós!

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Zé Albano

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