“Caminhando se faz caminho”
Entre as publicações que viram a luz da edição no triste 2020, está um livro de poesia edição de autor, datado de outubro. A edição passou um pouco despercebida na cidade, já que o autor quis algum recato. Tirando o jornal “A Guarda”, que noticiou o acontecimento, a imprensa em geral passou ao lado. O título, como o leitor já se apercebeu, é uma paráfrase do célebre verso de António Machado: “caminhante não há caminho, o caminho faz-se ao caminhar”. Nesta linha o livro é, de facto, uma proposta de caminhada.O autor é o Padre Manuel Igreja Dinis, actual pároco do Sabugal, nascido no Rochoso. Tem um percurso variado por algumas terras da nossa diocese e instituições. O gosto pela poesia vem de longe e muitos dos poemas publicados no livro foram publicados com o pseudónimo Dimo. Durante muitos anos foi publicando estes poemas na página que semanalmente ia orientando, no Jornal “Amigo do Sabugal”. Como referido acima trata-se de uma proposta de caminhada destinada “a ajudar aqueles, que lendo estes poemas, revivam os acontecimentos do passado e sintam algum consolo interior em tempos muito difíceis como estes, que estamos atravessando” como refere o autor no texto introdutório. Acrescenta ainda que esta caminhada é em forma de verso pois a poesia “é uma maneira de realçar os pequenos e os grandes acontecimentos da vida espiritual, humana e social”. Porquê em poesia? “A poesia sabe descobrir o valor dos pequenos acontecimentos que nos rodeiam e realça-lhes a sua beleza e ternura, ajudando a vencer as dificuldades e as agruras da vida”. Ficamos pois a saber logo à partida que o livro tem estas 3 componentes que o autor realça e especifica: a caminhada espiritual, a vertente humana e o aspeto social. O livro em si, está dividido em 22 títulos / partes, onde encontramos o ciclo natural das quatro estações (V – outono, VIII – primavera, IX – inverno e XIX – verão) e o ciclo litúrgico (II – Advento, IV – Imaculada Conceição, VI – Natal, X – Quaresma, XI – Páscoa). Além destes dois ciclos temos grupos de poemas com uma vertente reflexiva (XIII – Reflexões, XV – cultura, Passeios, XVII – Interrogações de Vida, XXI – Belezas da Vida.) A poesia de Dimo é simples e rimada na sua maior parte com aproximação à vida. Nota-se que os poemas, embora trabalhados, são produto de sentimentos momentâneos ou fruto, como o autor deixa entender, de reflexões ocasionais a propósito de acontecimentos da vida. Alguns são mais expressivos que outros, mas nota-se a preocupação de transmitir uma mensagem abrangendo as três componentes referidas acima. No prefácio temos isso comprovado através das palavras de Maria Emília Dinis Costa: “… ao longo de muitos anos, foi registando em verso as impressões de uma atenta e permanente observação das pessoas e das situações do quotidiano” e adianta que “os poemas que compõem este livro são uma espécie de corolário de uma vida de atenção e dedicação aos outros, mas também o tributo de uma alma simples e íntegra, que abriga tudo e todos os que nela possam caber”. É, de facto, uma poesia de atenção ao semelhante e ao mundo que o rodeia, revelando uma preocupação humanista e humanitária. O outro é o objecto dos poemas onde se desvela um mundo de intensidade religiosa e social resultante da sua missão apostólica. E do constante olhar humanitário sobre o próximo.Há um outro conjunto de poemas, uns agrupados (XII – Maria, Nossa Senhora), outros dispersos sobre Nossa Senhora e a devoção mariana quer na Igreja, quer na região. Neste caso estão os poemas sobre a Senhora da Graça, ermida do Sabugal, ou em âmbito mais lato as referências aos santuários marianos de Fátima e Lourdes. Por fim, a região também é visitada em vários textos, recorrendo a memórias vividas ou a passeios deambulatórios por vários lugares: rio Côa, Serra-mãe, as capeias raianas, os santos populares na poesia, mas também nos últimos três textos em prosa com que termina o livro.São variados os motivos para se ler a obra. Como estamos na Semana Maior a caminho da Páscoa da Ressurreição fica um poema para meditarmos.
DOMINGO DE PÁSCOA*
Sol da vida levantou-se cedoE libertou-se da prisão da morte.Está aqui patente de deus o dedo,Para dar ao mundo a melhor sorte.
O túmulo novo está aberto, Não é preciso arrastar a morte.O poder de Deus está perto,A todos ele dá a melhor sorte.
Proclama Maria aos quatro ventos,Senhor Jesus cristo ressuscitou!Após duras sombras, cruéis tormentos,Da tumba da morte se levantou.
É preciso que o saiba toda a terra!É preciso acordar os indolentes!Não pode haver mais mortes e guerra,Levai a paz aos homens penitentes.
Aleluia! No céu, de novo a Luz!Raios luminosos do novo SolIrromperam da árvore da cruz.Alegra-te, ressuscitou Jesus!(*Manuel Igreja Dinis, Caminhando se faz caminho, pág. 93)