Num dos manuais da minha instrução primária, que teve lugar em meados do século passado, um dos textos de que já não me recordo o título, bem como o do referido compêndio, começava mais palavra menos palavra por uma frase que tinha este sentido: “Dar a vida pela Pátria é uma grande virtude”, continuada pela respetiva fundamentação.
Serve isto para dizer que toda a minha formação como homem assentou em três pilares que sustentavam o ensino escolar, bem como o doutrinário, Deus, Pátria e Família. Quem não seguisse o rumo dentro destas três linhas de orientação passaria a ter um rótulo que o impedia de levantar a cabeça perante os demais.
Quando se atingia a idade de começar a organizar a sua vida, quer no aspeto laboral, quer no aspeto familiar, tinha ainda que cumprir o serviço militar obrigatório, com um período mínimo a rondar os três anos, que no meu ponto de vista era a pior de todas as ditaduras. Resmungar a uma ordem, para além da punição que o militar recebia, ficava ainda inibido de concorrer a qualquer função digna, pois tudo vinha registado na sua caderneta militar e a vermelho. Quem a não tivesse limpa, expressão usada no tempo, e que significava isenção de castigos, não podia sequer ser um humilde sapador a auferir do erário público.
Hoje, mais de meio século passado as coisas viraram ao ponto de os três valores que se defendiam passarem a ter ordem inversa. Consideramos um cidadão honesto e exemplar, aquele que acima de tudo defenda a sua família. As outras qualidades perderam a importância e são vistas como meras opções pessoais. Mesmo no que concerne à família o dever também aí se liberalizou, porquanto ninguém perde o seu estatuto pessoal por divergências na sua conduta familiar.
Vistas as coisas por este prisma e colocando Deus acima de todos os patamares, resta-nos jogar com dois valores, que pelo que acabei de afirmar a família tem de se colocar à frente, em detrimento do bem comum, a ditosa Pátria, que deixou de ser amada para ficar à mercê de tantos vermes que a vão sugando.
O espólio que a Nação tinha, referindo-me só ao continente europeu, está a ser vendido a dez reis de mel coado. Para que isso seja bem disfarçado, abandona-se a conservação dos bens que se visam alienar até que deixem de ser rentáveis, depois alega-se a privatização como sendo a melhor saída, para a economia do país.
Face a este estado de coisas, já vão rareando as estruturas que tenham visíveis a sua pertença, estou a referir-me à designação de “Património do Estado”, embora algumas funcionem com a mesma função, acabam por estar inseridas em parcerias, que muitos de nós, por mais esforço que se faça, não conseguimos entender.
Podem-me dizer que o Estado não é uma locomotiva que possa rebocar tudo o que mexe neste país e que até é bom que se lhe alivie a carga, deixando para os privados coisas de somenos importância, onde até estão mais vocacionados. Poderia concordar se a mesma locomotiva reduzisse o seu consumo, para menos peso menor consumo. Ora o que acontece é o invés, pagamos cada vez mais para termos cada vez menos, a justiça, a educação e a saúde espelham com toda a nitidez tudo o que aqui afirmo.
Também acontece outro paradoxo bem visível, é que quanto menos tarefas o Estado tem, maior é o número de tarefeiros para acolitar os inquilinos de São Bento e os da Praça do Comércio, que mais não fazem do que vergarem perante o capitalismo, que sem escrúpulos vai passando por Lisboa.
Já que vem a talhe de foice, permitam-me fazer uma pergunta. Pela comunicação social chega até nós o conselho que os senhores que mandam no Mundo dizem para Portugal executar: – Reduzir o número de funcionários públicos e polícias.
Eu questiono: – E para quando a redução de políticos?
Com certeza que esta proposta já não virá a tempo, pois se ela tivesse lugar, o Governo não hesitaria em apontar o extermínio de toda a oposição que se torna o maior empecilho.