Viagens ao reino de Clio
O reinado de D. Manuel não ficou marcado apenas pela descoberta do caminho marítimo para a Índia. Em março de 1500, mandou el-rei aparelhar uma frota de treze navios, com mais de mil homens, dirigida por Pedro Álvares Cabral, filho de Fernão Cabral, alcaide-mor de Belmonte. A armada destinava-se à Índia, cujo caminho marítimo havia sido descoberto dois anos antes por Vasco da Gama. A bordo seguiam ricos presentes, com os quais o rei português queria estabelecer relações duradouras de comércio com o rei de Calecute, de acordo com as instruções rigorosas dadas por Vasco da Gama. A frota levava mantimentos para dezoito meses e era composta também por oito frades da Ordem de São Francisco, de que era vigário Frei Henrique de Coimbra, o qual faria a primeira missa em território do Brasil.
As recomendações de Vasco da Gama para Pedro Álvares Cabral: “ Esta é a maneira que pareceu a Vasco da Gama que deve ter Pedro Álvares em sua ida, prazendo a Nosso Senhor. Primeiramente, antes que daqui parta fazer muito boa ordenança para se não perderem uns navios dos outros nesta maneira. Cada vez que houverem de virar fará o capitão-mor dois fogos e todos lhe responderão com outros dois, cada um. E depois de assim lhe responderem, todos virarão. E assim lhe será dado de sinal que a um fogo será para seguir. E três para tirar moneta (pequena vela). E quatro para amainar. E ninguém virará nem amainará nem tirará moneta sem que primeiro, o capitão-mor, faça os ditos fogos e todos tenham respondido. E depois que assim todos forem amainados, não guindará nenhum senão em seguida ao capitão fazer três fogos e todos terem respondido. E faltando algum não guindarão mas somente nadarão amainados até que venha o dia, porque as naus não poderão rolar tanto que ao amanhecer se não vejam. E para se aparelhar qualquer que for desaparelhado fará muitos fogos, de maneira que os outros navios vão a ele.”
Como se sabe, a armada de Pedro Álvares Cabral que se dirigia à Índia descobriu uma nova terra em 1500, a Terra de Vera Cruz, mais tarde denominada Brasil. A descoberta desta nova terra causou grande estranheza no reino de Portugal, sobretudo nos meios ligados à náutica e à política. Não se sabia se os barcos foram atirados para esta nova terra devido a uma tempestade ou se já se saberia que existiam estas terras e que, neste caso, os reis de Portugal estavam a tomar posse do que foi acordado no Tratado de Tordesilhas, pois o rei tinha exigido que as 270 léguas a ocidente dos arquipélagos dos Açores e Cabo Verde pertencessem à zona portuguesa, ao invés das 100 que os reis de Espanha tinham pedido.
Na armada seguia Pero Vaz de Caminha, escrivão do rei, que tinha o propósito de escrever tudo o que fosse considerado importante para dar conhecimento a el-rei. Eis como descreveu o achamento da Terra de Vera Cruz (Brasil):
“A partida de Belém, como Vossa Alteza sabe, foi segunda-feira, 9 de Março. Sábado, 14 do dito mês, entre as oito e as nove horas, nos achámos entre as Canárias, mais perto da Grã Canária, onde andámos todo aquele dia em calma, à vista delas, obra de três a quatro léguas. E domingo, 22 do dito mês, às dez horas, pouco mais ou menos, houvemos vista das ilhas de Cabo Verde. Na noite seguinte, segunda-feira, ao amanhecer, se perdeu da frota Vasco de Ataíde com sua nau, sem haver vento forte nem contrário para que tal acontecesse. Fez o capitão suas diligências para o achar a uma outra parte, mas não apareceu mais! E assim seguimos nosso caminho, por este mar, até que terça-feira das Oitavas da Páscoa topámos alguns sinais de terra, os quais eram muita quantidade de ervas compridas a que os mareantes chamam botelho, assim como outras a que dão o nome de rabo-de-asno. E quarta-feira, pela manhã, topámos aves a que chamam furabuchos. Neste dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! Primeiramente de um grande monte, mui alto e redondo; e doutras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos: ao monte alto o capitão pôs o nome – O Monte Pascoal – e à terra – A Terra de Vera Cruz.”
Pedro Álvares Cabral tinha acabado de descobrir o Brasil!