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D. José: adaptar Portugal às grandes transformações do mundo (III)

Viagens ao reino de Clio

DESCRIÇÃO DO IMPACTO DO TERRAMOTO DE 1755 POR QUEM O TESTEMUNHOU

LAGOA

“Não houve cidade, vila, fortaleza, lugar ou aldeia que não experimentasse, mais ou menos, ruína.
Principiou-se a sentir pelas nove horas da manhã e durou perto de um quarto de hora, ainda que alguns lhes acrescentam mais minutos. Com a violência dos seus abalos ficaram destruídas todas as igrejas com as suas torres, os conventos dos religiosos e religiosas de todas as cidades e vilas.
Todas as casas, grandes e pequenas, todo este lugar que era muito populoso se acha arrasado e da mesma forma todas as casas que haviam na freguesia e aquelas que não se precipitaram ficaram sem telhados e as paredes abertas com grandes brechas.
Em Silves, ruas inteiras ficaram arruinadas, perdendo-se nelas infinita gente, que se anda desenterrando para se lhe dar outra sepultura. Em Boliqueime, freguesia da vila de Loulé, se enterraram ontem 150 pessoas de diferentes idades que acabaram neste fatal destroço.
O mar desta costa subiu tantas varas sobre a sua superfície que entrando pelas ribanceiras inundou os campos e quando retrocedeu levou consigo as fortalezas que nela havia para impedir os desembarques dos mouros e com elas toda a vila de Albufeira que estava sobranceira na mesma costa; deixando nos matos um grande número de peixes grandes e pequenos.”

BENAVENTE

“No Tejo velho, perto de um sítio chamado o Gravalho, alteou tanto a terra que não nadavam as embarcações preia-mar, a maior parte da terra abriu bocas de sorte que em muita custa a lavrar e em muitas delas se notou que rebentando, delas saía cheiro de enxofre e areia negra e fétida e as águas que estavam empoçadas correram para o mar com o mesmo mau cheiro.”

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CASTELO DE VIDE

“No dia 1 do corrente, entre as nove e dez da manhã se sentiu no campo vizinho desta vila um ruído subterrâneo semelhante ao que fazem as ondas do mar furioso nas cachopas da barra de Lisboa e se percebeu que começava da parte do nascente, foi-se chegando para mais perto e não só começaram a cair paredes e valados das vinhas e fazendas mas a mesma terra a mover-se de maneira de abaixo dos pés das pessoas, que nela estavam, que lhes perturbou a vista e lhes custou cuidado sustentarem-se de pé; porque até as pedras que estavam no caminho se moviam, de sorte que parecia que ferviam ou dançavam, chegou também primeiro a esta vila o estrondo subterrâneo, que o terramoto. Entenderam os que ignoravam a causa, que era uma carruagem que rodava com força pelas ruas e imediatamente se sentiu o tremor e se viram os efeitos. Achava-se a este tempo muita parte da gente nas igrejas, para ganhar o jubileu, e entendendo que elas se arriscavam, fugiu precipitadamente para a rua e a seguir os mesmos sacerdotes, que estavam celebrando a missa, na forma em que se achavam paramentados cresceu a violência do terramoto de modo, que deixou atónitos e consternados mais aos que se viam nas ruas, que aos que estavam em suas casas vendo os movimentos que faziam as casas, as igrejas e as torres; a grande do castelo que é muito alta e de grossura extraordinária as suas paredes padeceram tão grandes balanços, que sacudiu de si as suas ameias e lançou de si tanta poeira, que formou uma nuvem. A fonte da vila deixou de correr durante o terramoto e depois lançou água turva.”

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LISBOA

“No 1º de Novembro pelas nove horas e três quartos começou a tremer a terra; levantei-me da cadeira, em que me estavam fazendo a barba, e fui para uma janela da rua; estando nela continuou a tremer com grande violência por tempo, que dizem fora mais de um minuto; quando parecia que acabava, fez a terra um moto tão forte, como até agora não tinha feito. Ao segundo ou terceiro abano começaram a cair os edifícios. O primeiro foi a Casa da Misericórdia e a do amigo António Fernandes. Depois a dos mais. Acabou: fui dentro buscar o meu crucifixo, que a minha criada já tinha tirado. Tanto que a poeira deu lugar, saí a ver se era alguém vivo na casa do dito amigo e achei todos sem lesão. […]
Perto do meio dia repetiu. Os fogos que logo se ateavam em várias partes, vinham já para perto; com o que resolvi depois de três horas, a que saíssemos da nossa pátria; parti sem bolsa, sem caixa, sem lenço e sem chapéu; o vestido interior e um roupão foi o que Deus quis me restasse. Com grandes sustos e trabalhos chegámos ao Rossio, onde estava imenso povo e muitos amigos e conhecidos, uns feridos, outros nus, todos mal compostos. Já S. Domingos tinha ardido e o maior incêndio era no Hospital.”

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