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D. João III – Descobrimentos, cultura e saber (IV)

Viagens ao reino de Clio

Em 1537, o rei português mandou que “as Artes se não leiam em Lisboa”. Estava assim decidida a transferência da Universidade de Lisboa para Coimbra, o que ocorreu várias vezes desde a sua fundação. A decisão foi tomada em segredo e combinada entre o rei e frei Brás de Barros, distinto humanista e teólogo muito apreciador do pensamento de Erasmo, do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, um dos centros do saber medieval português e europeu. Desde essa data, a universidade não mais voltaria a sair de Coimbra.
De todos os professores que compunham a universidade em Lisboa, apenas três foram convidados a ir para Coimbra: Gonçalo Vaz Pinto, de Leis, Duarte Gomes, de Artes e Francisco de Monzón, de Teologia. Para a instalação ser digna, o próprio rei cedeu o seu palácio, da alta da cidade e convidou alguns bolseiros de Paris e os melhores mestres estrangeiros para conseguir uma reforma profunda no ensino português. Curiosamente, em 1531, perante a ideia da universidade ser transferida para Torres Vedras, os vereadores, o procurador e os homens-bons desta terra enviaram uma carta ao rei rogando que a não instalasse ali, porque, segunde eles, já viviam em Torres Vedras demasiados fidalgos que exigiam rendas elevadas ao povo, provocando-lhes a miséria. Pensavam eles que a vinda de muitos estudantes agravaria as obrigações dos locais, aumentando-lhe a desgraça.
Os mestres escolhidos, em Paris, por André de Gouveia, de acordo com a ordem de D. João III, foram João da Costa, Diogo de Teive, António Mendes de Carvalho, Nicolau de Granchy, Guilherme de Guérente, Elias Vinet, Arnaldo Fabrício, Jacques Tapie, George Buchnam e Patrício Buchnam. No ano da transferência da Universidade para Coimbra, seguindo o mesmo princípio, o rei fundou o Colégio das Artes: “Eu, El-Rei, faço saber a quantos este meu Regimento virem que vendo eu quanto serviço de Deus e proveito da República será haver um colégio Real em que bem possam ser doutrinados e ensinados todos os que quiserem ir aprender Latim, Grego, Hebraico, Matemática, Lógica e Filosofia, determino ora de mandar fazer o dito Colégio na cidade de Coimbra onde já instituí a Universidade que ordenei que nela houvesse para todas as ciências. E quero que a pessoa que há-de ter o cargo de governança do dito Colégio, se chame principal dele e reitor da dita Universidade, nem outra alguma pessoa tenha superioridade sobre o dito Colégio e principal. E a pessoa que hei por bem que seja o principal do dito Colégio é o doutor mestre André de Gouveia”.
No ano anterior à fixação da Universidade em Coimbra, o papa Paulo III concedeu a bula que estabeleceu o Tribunal do Santo Ofício (Inquisição) em Portugal. O rei solicitou ao papa que nomeasse inquisidor-mor o infante D. Henrique, arcebispo de Évora, sendo estabelecidas mesas inquisitoriais em Lisboa, Coimbra e Évora. Muitos consideraram necessária a vinda da inquisição para o nosso reino pois existiam muitos cristãos-novos que continuavam a seguir a religião judaica, de modo secreto. Outros, todavia, consideravam que o principal objetivo da Inquisição era o de confiscar as fortunas que os judeus poderosos detinham para reverterem a favor do estado. Nesta época, o estado passava por grandes dificuldades com as despesas provocadas pelas armadas do oriente, com a pressão dos mouros no Norte de África, com os prejuízos provocados pela pirataria francesa e com a fraca arrecadação de impostos.
Deste modo, registou-se um número cada vez maior de pessoas que sairam do país, levando tudo quanto podiam, aterradas com a possibilidade de virem a ser julgadas por este tribunal.  
Em 1540, o inquisidor-mor infante D. Henrique, ordenou que não fosse publicado nenhum livro sem a prévia autorização do Tribunal do Santo Ofício. Este tribunal passou a ter o poder de censurar qualquer livro, no seu todo ou em parte, e os seus agentes podiam atuar em qualquer lado. Chegaram mesmo a queimar os livros considerados heréticos. Como consequência, alguns intelectuais portugueses começaram a manifestar o seu desagrado, mas este poder levou a que o país ficasse cada vez mais isolado da inovação literária e do progresso cultural que se começava a fazer sentir nas nações mais evoluídas da Europa.
D. João III, cognominado O Piedoso ou O Pio pela sua devoção religiosa, morreu no dia 11 de junho de 1557, com um fulminante ataque de apoplexia. O funeral realizou-se na capela-mor da Igreja dos Jerónimos, onde também foi sepultado, pois este templo passou a ser o Panteão Real na era manuelina.

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