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D. Filipe III de Espanha e II de Portugal: mais para ser governado que para governar

Viagens ao reino de Clio

Com a morte de Filipe II de Espanha e I de Portugal, no dia 13 de setembro de 1598, sobe ao trono de ambos os países o seu filho, D. Filipe (III de Espanha e II em Portugal). Sabe-se que quando o pai do príncipe herdeiro agonizava, o fidalgo D. Cristóvão de Moura, para o sossegar, lhe disse que o seu sucessor seria competente para governar os dois impérios, ao que o moribundo respondeu que “era mais para ser governado que para governar”. Por esse motivo designou o duque de Lerma para assumir todos os encargos da governação.
Ao monarca era atribuído um carácter fraco e indeciso pelo que, na prática, o duque de Lerma assumiu a governação de ambos os países. Apesar de tudo, este procurou favorecer o nosso país e criar laços mais sólidos. Algumas medidas que tomou: desenvolvimento da marinha nacional; abolição dos portos secos e das alfândegas; abertura dos nossos portos ao comércio britânico e holandês, embora este último tenha durado pouco tempo.
Com a chegada ao trono português de mais um rei espanhol, que designou para vice-rei de Portugal D. Cristóvão de Moura, fidalgo português ao serviço de Espanha, cresceram os receios de que o país se transformasse, cada vez mais, numa simples província de Espanha, governado a partir de Madrid. De facto, foram nomeados cinco ministros castelhanos para Portugal e funcionários para fiscalização do comércio efetuado através da Carreira da Índia e da própria Fazenda Real.
Em 1608, Luís Mendes de Vasconcelos publicou em Lisboa um livro, “Do sítio de Lisboa: Diálogo”, fruto da sua experiência militar em terras do oriente e de África: “E deixando os queijos, manteiga e presuntos de que os flamengos trazem quantidade infinita – de trigo, cevada e centeio (que são as coisas mais necessárias e de que a falta é mais perigosa) vem tanto de França e Alemanha, parece impossível produzir a terra lá tanto, nem cá gastar-se tudo; porque entram todos os anos neste porto mais de três mil navios e a maior parte deles carregados de trigo. Assim deste terreiro do trigo correm perpétuos rios de trigo, cevada, centeio, milho e legumes, com que se sustenta infinito número de gente. E, ainda que vemos cada dia a grandeza deste Terreiro, não deixarei de dizer quatro coisas.
A primeira, que todos os dias estão duzentas pessoas medindo aos que vêm comprar, sem cessar de manhã, à noite, e algumas vezes mais de trezentas; a segunda, que é um grande trato alugar sacos para o trigo que se tira do Terreiro, com o qual há pessoas muito ricas; a terceira, que há um juiz do Terreiro com os seus oficiais, que dos bons ofícios da cidade, não tendo mais jurisdição que nas coisas do mesmo Terreiro; e a quarta, é haver muitos homens que vivem só de tirar o artigo dos navios e tercenas para o Terreiro e tem um, que é sua cabeça, que lhes distribui o que hão-de fazer, o qual só com este negócio está riquíssimo.”
Noutro livro, de Francisco Rodrigues Lobo, intitulado “Corte na aldeia”, refere-se: “ Retirados os títulos pelas vilas e lugares do Reino, e os fidalgos e cortesãos por suas quintas e casais, vieram a fazer cortes nas aldeias, renovando as saudades do passado, com lembranças devidas àquela dourada idade dos Portugueses”. O autor aborda o abandono da capital portuguesa, por parte dos fidalgos, que voltaram a habitar os seus palácios na província. Esta situação, motivada pela ocupação de Lisboa por governantes espanhóis, acabou por provocar maior convívio entre a nobreza portuguesa, gerando focos de descontentamento e resistência política, em favor da total independência nacional.
D. Filipe II ficou conhecido em Portugal como O Pio ou O Piedoso.  Em 1619, quando abandonava Portugal, adoeceu gravemente e nunca mais se restabeleceu. Esteve acamado durante cerca de dois meses, coberto de chagas e abcessos e morreu aos 71 anos, a 31 de março de 1621, devido a trombo-embolismo pulmonar, provocado pela imobilização prolongada a que foi sujeito.

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