O Outono está aí mesmo à porta.Depois da esperança que muitos depositámos no sol de Agosto,

no calor do Verão e na serenidade de umas férias retemperadoras e sossegadas, chegaram os dias em que o verão começa a fazer-se outubro, trazendo já, “como as sombras que anunciam o poente, o travo frio e implacável do outono a suceder-se ao verão, (…) o verão moribundo a atiçar-se ainda uma vez mais como um morrão de brasa, chegando ao fim” (“William Faulkner, “Luz em Agosto”, D. Quixote, 2ª ed. revista, julho de 2016, pág. 227).E às sombras do poente, anunciadoras dos tempos frios que se aproximam, somam-se as preocupações com a saúde pública, no momento em que, previsivelmente, chegamos à época do ano em que a situação pandémica poderá agravar-se. Como escrevem no “Público” Francisco George e Constantino Sakellarides, dois ex-directores-gerais da Saúde, “Portugal decidiu fechar as escolas quando tínhamos cerca de 80 novos casos/dia e vai abri-las quando teremos cerca de 400”. Acrescento, a propósito, que, hoje, dia 9 de setembro, o número de novos casos-dia atingiu os 646. Na verdade, os contágios não param de crescer desde meados de agosto, em Portugal como na Europa. Chegamos, assim, ao momento da reabertura das aulas com números preocupantes e surtos graves e imparáveis na sociedade em geral e, em particular, nos lares de idosos onde os mais velhos se afligem com os dias que aí vêm.A Festa do Avante feneceu e continuo a pensar que foi um erro estratégico – e inesperado – do PCP que talvez não estivesse à espera da reação popular que, por ação ou omissão, se afastou das celebrações e criticou, sem intervenção do grande capital ou qualquer influência de propósitos fascizantes, a iniciativa comunista em tempo de pandemia. Também não me parece importante repetir o que já todos sabem: o PCP tem muita dificuldade em demonstrar respeito e tolerância pela opinião diferente. Quem se atreve a criticá-lo é qualificado como “antidemocrático”, “reacionário” ou “fascista”. O PCP vê na crítica mais singela e natural, fruto da discordância legítima, o ataque do “grande capital” e dos interesses reacionários contra os trabalhadores e o povo.Mais significativo e relevante foi o posicionamento compreensivo e colaborante das autoridades sanitárias e do próprio Governo, com o seu apoio, fraternal e solidário, à realização da Festa. Sem uma crítica nem um reparo, sem uma prevenção ou um alerta, o governo minoritário do PS avalizou a iniciativa do PCP. Cópia da boa vontade do primeiro-ministro ao chamar os comunistas para uma renovação da “geringonça” que aprove o Orçamento do Estado para 2021? É que estamos lembrados do gesto de António Costa apelando enfaticamente aos seus anteriores aliados para se reunirem ao governo de forma a alcançar-se uma maioria, (que hoje não existe), mobilizadora de uma governação à esquerda, em proveito dos desfavorecidos, “dos trabalhadores e do povo” na formulação tão do gosto do PC. Costa construiu a ameaça de uma crise política, tão fictícia como impossível, que levaria, em última instância, à queda do Governo e à dissolução da A.R. Se bem que simulada, essa “crise” não deixa de encerrar o gérmen de uma chantagem para os partidos assim aliciados, à sua esquerda. Veremos como vão os mesmos responder, tendo presentes os resultados retirados da anterior experiência governativa. Penso que o PCP, mais institucional e responsável, vai responder com maior exigência e rigor a esse apelo do que o BE, de perfil populista e dirigido por chefias com projetos pessoais ambiciosos, logo, mais atraídas pela aproximação ao poder.Entretanto, posicionam-se já na linha de partida os candidatos às eleições presidenciais. Além do candidato do Chega!, André Ventura, e de um candidato desconhecido da Iniciativa Liberal, acaba de ser anunciada a candidata do Bloco, Marisa Matias, ao mesmo tempo que a socialista de esquerda Ana Gomes comunicou a intenção de se candidatar. Fica a faltar saber quem será o (ou a) candidato(a) do PCP, além de ter de se aguardar mais algum tempo pela formalização da candidatura do atual P.R., Marcelo Rebelo de Sousa. Admito que outros candidatos, à espera do seu quarto de hora de fama, possam ainda vir a perfilar-se.Vamos assistir, com a chegada do inverno, a uma campanha eleitoral invulgarmente aguerrida, com alguns candidatos preparados para disputarem acaloradamente e com alguns prováveis entorses à Ética, o voto dos eleitores. Entrementes, a pandemia fará o seu caminho, ainda sem vacina nem tratamento específico…. Terá a sua evolução influência na escolha dos eleitores aquando do exercício do seu direito de voto? É que as dificuldades do SNS não vão limitar-se à resposta a uma provável segunda vaga da Covid-19 : as consultas e as cirurgias de há muito adiadas, a falta de resposta dos centros de saúde, marcando consultas que, à última hora, são desmarcadas, entre outras insuficiências, faz recear o aumento exponencial de outras patologias que poderá ocorrer no inverno, a par do advento da habitual epidemia da gripe. E eis que o senhor Primeiro-Ministro, revigorado talvez pelas férias, não encontrou melhor cenário para abrir uma “guerra” com a Ordem dos Médicos, numa quezília de todo “descabelada”!Voltando aos candidatos já anunciados às eleições presidenciais, será interessante conhecer os efeitos, dentro do PS, da decisão de candidatura por parte de Ana Gomes. Também será curioso seguir as campanhas e o confronto entre a populista Ana Gomes e a bloquista Marisa Matias, mais racional e serena. Como é que se irão comportar, no calor da luta política, uma candidatura pessoalmente mais moderada e sedutora mas “identificada” com um partido mais extremista, em confronto com as intervenções explosivas e indignadas de uma “passionária” oriunda do partido instalado no poder? E ainda: qual será a estratégia futura adotada pelo candidato do Chega!, que,  aliás com muito mau gosto, já se posicionou contra o anúncio da candidatura de Ana Gomes? Como se irão confrontar os populismos de esquerda e de direita personificados por Ana Gomes e André Ventura? E por fim, conseguirá o atual PR “fazer as pazes” com o PSD e com o CDS, por forma a poder contar com a generalidade dos votos dos seus eleitores? E será que, como consequência da “fuga de votos” para a candidata Ana Gomes, poderá beneficiar da larga maioria dos votantes do PS?  E no geral, como se irão comportar a abstenção e o voto nulo ou branco, tendo presentes as consequências da evolução da pandemia, da crise social e das respostas do SNS e da DGS? Eis, meus caros leitores, as grandes expetativas que se levantam neste doce Outono, ao cair da folha…Praia das Maçãs, 9 de setembro de 2020