O evangelho de hoje transporta-nos ao Cenáculo,
ao lugar onde Jesus celebrou a Última Ceia com os seus discípulos, ao momento em que lhes dirigiu as últimas palavras e se despediu deles. Por ser véspera de morte, as palavras de Jesus adquirem aqui um peso e uma carga afectiva sem precedentes. Também por isso, devem por nós ser lidas, escutadas e meditadas com o máximo de atenção e seriedade. São palavras decisivas.
As primeiras palavras de Jesus são sobre o tema da glória: “Agora foi glorificado o Filho do homem, e Deus foi glorificado n’Ele”. “Agora”, isto é, na cruz, na morte e na ressurreição, o Filho do homem (Jesus) e o Pai são glorificados. Em que sentido? Pode ajudar-nos recordar a famosa afirmação de Santo Ireneu: “A glória de Deus é o homem vivo”; ou ainda a do filósofo francês, Gabriel Marcel: “Amar é dizer a alguém: não quero que morras”. Na cruz, escutamos a palavra definitiva de Deus a cada um: ‘amo-te e não quero que morras; morro para que não morras tu, porque a minha glória é que vivas.’ E Santo Ireneu completa: “e a vida do homem é ver a Deus!”
Na morte e na ressurreição, Deus diz definitivamente Quem é (“não é um Deus de mortos mas de vivos”) e qual a sua vontade (“tanto amou Deus o mundo que lhe entregou o seu Filho Unigénito, a fim de que todo o que n’Ele crê não se perca mas tenha a vida eterna”).
A morte de Jesus, como o culminar do seu amor aos homens e do seu amor obediente ao Pai, é também o momento em que se revela a nossa vocação: “Como Eu vos amei, amai-vos uns aos outros”. A primeira aliança, celebrada no Sinai, exigia o cumprimento dos dez mandamentos. Agora, a nova e eterna aliança, celada com o sangue derramado na cruz e celebrada na Última Ceia, exige o cumprimento do novo e único mandamento do amor.
Amar-nos uns aos outros como Cristo nos amou. Se fôssemos capazes de perceber, e de perceber definitivamente, que não somos cristãos se não para isso… Se fôssemos capazes de fazer esta pergunta a nós mesmos: se ninguém soubesse que sou baptizado; que frequentei a catequese e fiz a primeira comunhão; que sou casado na Igreja, consagrado ou ordenado padre; se nunca ninguém me tivesse visto a entrar numa Igreja, a ir à missa aos domingos… se estivesse proibido de dizer que sou cristão, mas não prescindisse de o ser, o que me restaria?
“Nisto conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros”. Jesus quer que os cristãos sejam conhecidos única e simplesmente pelo modo como amam. Religiões há muitas. Para amar não é preciso ser cristão. Mas para amar com Jesus e como Jesus sim. Para amar até dar a vida. Para perdoar. Para amar os inimigos… tal como Ele faz connosco. Um modo de amar que faça a diferença. Por ser diferente. Por vir de Deus.