No seguimento do que reflectimos no domingo passado sobre a importância de rezar sempre, sem desanimar, esta semana Jesus conta a parábola do fariseu e do publicano que sobem ao templo para orar.
“O fariseu, de pé, dava graças por não ser como os outros homens” (Lc 18, 11) e enumerava as suas virtudes (v. 12). O publicano, batendo no peito, e reconhecendo-se pecador, pedia a Deus compaixão (v. 13). À primeira vista, o publicano gera-nos alguma empatia e o fariseu antipatia ou repugnância. Mas que mal fez este último? Será que Jesus pretendia desprezar os esforços do zeloso fariseu e elogiar os erros do publicano? Claro que não! A questão não está tanto nas suas condutas morais, mas sim na forma como se dirigem a Deus e como fazem a sua oração. Assim, distanciando-nos de interpretações simplistas, talvez descubramos ainda melhor o cerne desta parábola.
Quase sem darmos conta, rotulamos o fariseu como um arrogante que despreza os irmãos e se julga melhor que os outros. Esquecemos que a parábola nos diz que ele é recto, justo, fiel e cumpridor dos deveres. Ao mesmo tempo simpatizamos com o publicano arrependido. Falhou, mas tem a nossa compreensão. Esquecemos que os publicanos, cobradores de impostos, eram considerados traidores da pátria e, na generalidade, deixavam-se corromper e não respeitavam ninguém. Por isso nos perguntamos onde queria Jesus chegar com esta parábola e onde está o erro do fariseu e a virtude do publicano? O erro e a virtude deles está na forma como fazem as suas orações. Apesar do bem feito pelo fariseu, ao atribuir a si mesmo as virtudes, deixa-se tomar pelo orgulho da autossuficiência e da vaidade. Ao contrário, apesar do mal feito pelo publicano, este confia humildemente na misericórdia de Deus.
Chegamos ao cerne da parábola. O seu núcleo está para além do que estas personagens fazem no seu quotidiano e, inclusive, até da forma como rezam. O fundamental é reconhecer o papel de Deus na justificação de cada um deles. O fariseu ainda não percebera que a salvação é dom de Deus. Continuava convencido de que alcançaria a salvação, exclusivamente, por mérito próprio. Dominado pelo orgulho, e exaltando-se a si mesmo, fechou-se à graça de Deus. O publicano, por sua vez, talvez ainda não tivesse percebido plenamente a teologia da graça de Deus, mas estava mais próximo de a aceitar na sua vida, porque, ao reconhecer-se pecador, confia na misericórdia de Deus, a quem implora compaixão. De mãos vazias, colocou-se nas mãos de Deus. Humilhado, consciente da sua fragilidade humana, “desceu justificado para sua casa” (Lc 18, 14), porque se deixou tocar pelo Deus misericordioso.
Senhor Jesus, quantas vezes também eu rezo como aquele fariseu: do alto da minha vaidade, ponho-me a enumerar cada uma das minhas virtudes, esquecendo que, se algum bem fiz, é todo ele fruto da Tua graça. Oh, dá-me a humildade de me ajoelhar a Teus pés, pedir perdão pelos meus pecados e reconhecer a minha pequenez diante da Tua misericórdia.
Amén.