O encontro com um homem piedoso e de boa vontade, mas no qual o apego às riquezas tinha sufocado a atitude humilde
e receptiva da criança, é a ocasião para Jesus concluir o seu ensinamento sobre as condições para seguir Jesus, entrar no Reino de Deus e ser salvo.
Santo Inácio de Loyola dizia: “trabalha como se tudo dependesse de ti, mas confia, consciente de que tudo depende de Deus”. Esta espécie de lema de vida pode reassumir aquilo que Jesus ensinou em precedência: para entrar no Reino de Deus, é necessário o esforço humano, são necessárias renúncias e espírito de sacrifício (carregar a cruz, ‘cortar’ mãos e pés, renunciar a si mesmo e ao que se possui, …); mas ao mesmo tempo, ser pobre em espírito, ser humilde e confiar na providência do Pai celeste, como uma criança, “porque dos que são como elas é Reino de Deus”.
A pergunta que o homem rico dirige a Jesus é um eco da pergunta essencial, existencial, que todo o ser humano faz, mesmo quem não o admite: qual é o significado da vida? Para que existo? Qual o objectivo final da minha vida e como posso alcança-lo? São outras formas de perguntar: “que hei-de fazer para alcançar a vida eterna?” É uma pergunta feita a Jesus porque na realidade só de Deus pode vir a resposta. Assim o reconhece a Igreja: “O mistério do homem só no mistério do Verbo encarnado se esclarece verdadeiramente”.
Jesus responde recordando os mandamentos que dizem respeito à relação com os outros. Assim revela que o caminho para o céu passa pelo cumprimento da vontade de Deus na terra, o caminho para Deus passa pelo bem feito ao homem. Mas o cumprimento destes mandamentos, por si só, não o satisfaz: “retirou-se pesaroso”, insatisfeito. Qual a razão? – “porque era muito rico”. Por detrás de um coração inquieto, insatisfeito, infeliz, está uma ilusão: que os bens materiais nos fazem felizes. Como é falácia que um copo de água salgada mate a sede, assim os bens materiais.
“A minha alma tem sede de Ti, Senhor, como terra árida”, reza o salmista. Reza o sábio da primeira leitura, aquele que encontrou a Sabedoria (que para nós é Cristo) e percebe que comparado com ela “todo o ouro não passa de um grão de areia”. Todos, quer o homem rico quer o homem pobre (os discípulos não eram propriamente ricos e também foram chamados a deixar tudo para O seguirem), estamos sujeitos a desperdiçar a vida caindo na loucura de abandonar a Deus, fonte de água viva, para irmos ao deserto (dos bens materiais) a cavar poços em busca de água.
Àquele que já cumpre a segunda parte dos mandamentos, Jesus convida a descobrir a primeira parte: Amar a Deus sobre todas as coisas. Amar a Deus é seguir Jesus: “vem e segue-me”; e para amá-l’O acima de todas as coisas: “vai, vende tudo, dá aos pobres”. Deixar tudo para seguir Jesus era o preço da felicidade, precisamente o preço que o homem rico não está disposto a pagar. Foi convidado a amar a Deus sobre todas as coisas, mas estava preso às coisas que o impediam de amar a Deus.
“Só te falta uma coisa”. Ao homem rico, aos discípulos daquele tempo e aos deste tempo, a mim e a ti, Jesus repete: “Só te falta uma coisa”: deixar tudo e seguir-me, ser livre como os pobres em espírito, confiar como as crianças. É assim que se entra no Reino.