“EU ESTOU SEMPRE CONVOSCO”
Celebramos a solenidade da Ascensão do Senhor. “Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim”, e tendo consumado a sua missão como Salvador, Jesus “subiu aos Céus”. Sem deixar de estar na terra… Enfim, para não correr o risco de acrescentar “explicações” inúteis, convido antes a rezar e meditar as palavras da oração da Igreja para a Missa de hoje: “Ele não abandonou a nossa condição humana, mas, subindo aos céus, como nossa cabeça e primogénito, deu-nos a esperança de irmos um dia ao seu encontro, como membros do seu Corpo, para nos unir à sua glória imortal”.
Pela encarnação, Jesus fez-Se homem e, nessa condição, presente fisicamente num tempo e num lugar concretos e determinados. Mas como nunca deixou de ser Deus e “Deus, amigo dos homens”, de todos se faz companheiro e contemporâneo. Não mudou de nome, continua a ser Deus connosco, Emanuel. A Ascensão revela uma forma de presença mais intensa: estende-se a todos os lugares (“ide a todas as nações”) e a todas as épocas da história humana (“estou sempre convosco”).
De que modo o Senhor cumpre a promessa de estar sempre connosco? De muitos modos, mas é especialmente nos sacramentos, sobretudo na Eucaristia, onde “Ele está no meio de nós”; na oração comum feita em comunidade ou em família, porque “onde dois ou mais se reunirem em Meu nome Eu estou no meio deles”; em cada ser humano, sobretudo nos necessitados de todo o género, pois o que lhes fizermos é a Ele que o fazemos. Nestas e nas mil e uma formas que o amor de Deus tem de se fazer presente.
Recordemos a experiência dos onze discípulos para a fazermos nossa. Encontram-se na Galileia porque aí os enviou o Ressuscitado (“Ide para a Galileia, lá Me vereis”). Não estão isolados, mas em comunidade. Não numa casa, mas num monte. Nessas circunstâncias, “viram-n’O e adoraram-n’O”. E Jesus aproximou-se e falou-lhes.
A Galileia era o lugar onde tudo tinha começado, onde Jesus os tinha chamado a primeira vez para O seguirem. Não foram ali para matar saudades mas para reforçar a esperança e a coragem. Para Jesus, não serve um discípulo que se agarra ao passado, que olha para trás porque “naquele tempo é que era bom”, nem um que olha apenas para o alto (“porque estais a olhar para o Céu?”), mas o que olha em frente e se deixa interpelar pela Palavra de Deus que envia, desafia e desinstala: “ide e fazei discípulos de todas as nações”.
No dia da ressurreição, Jesus encontrou os discípulos fechados numa casa com medo, mas agora faz questão de se encontrar com eles no monte que lhes indicara. Porque o monte é espaço aberto, lugar sem paredes nem portas, imagem da Igreja nascida do lado aberto pela lança e regenerada pela força do Espírito.
Da Galileia tinha Cristo chamado a maior parte dos seus discípulos. Embora generosos na resposta, revelaram-se lentos para compreender o alcance da novidade de Cristo: “vais restaurar o reino de Israel?” Agora que Cristo ressuscitado venceu o pecado e a morte, e, subindo aos céus, já não está limitado no tempo e no espaço, é preciso regressar à Galileia para recomeçar. Não se trata de restaurar o reino de Israel mas de instaurar o Reino de Deus. Fazer discípulos em todas as nações. A Igreja é a comunidade dos discípulos que não sonham em restaurar tradições mas em instaurar a novidade do Reino. É preciso a coragem de subir ao monte, símbolo de um tempo e espaço para Deus, para O experimentarmos próximo, para fazer silêncio e adorar, para O escutarmos e sermos reenviados ao mundo, a fazer discípulos, baptizando e ensinando a cumprir tudo o que Ele mandou.