Após o artigo escrito no último número do nosso semanário
sobre a força e o poder de espalhar ideias e convicções, li, no ‘L’Osservatore Romano’, o exemplo de dois casos onde sobressaía a eficácia de episódios reais para influir o pensar de outros e concomitantemente o seu proceder.
As histórias passam-se nos primórdios da década de quarenta do século passado, numa cidade da Itália. Protagonistas: Chiara Lubich e Ginetta Calliari, a primeira fundadora do Movimento dos Focolares e a segunda, colaboradora, desde o seu início. Foi esta que o levou para o Brasil, onde lhe dedicou a sua vida por mais de quarenta anos, até à morte cuja data recordámos a oito de Março.
Naqueles tempos, finais da segunda grande guerra, qualquer actividade que trouxesse uma certa agitação ou mudança de pensamento era olhada com reserva e prudência, mormente em assuntos eclesiais que ultrapassassem os costumes de então. E como o Movimento dos Focolares aparecia sob a orientação de leigos, as suas fundadoras tiveram de experimentar muitas desconfianças, incompreensões, dúvidas e medos. A caminhada não se lhes tornou fácil. Só vinte anos depois, quando o Concílio Vaticano II se reunira é que o Documento Sobre os Leigos optou por novas praxes e aprovou actividades dirigidas por leigos, quer homens quer mulheres.
Felizmente a sua doutrina estava bem alicerçada. Por isso, do Concílio lhe adveio uma aprovação no que se refere à doutrina e um grande impulso quanto à actividade.
Foi precisamente numa palestra das ensinadas frequentemente por Chiara Lubich aos filiados que contou dois episódios vividos, no início do Movimento, por Ginetta. Principiou, então, por narrar a descoberta de Deus amor experimentada naqueles anos do princípio, quando reinava a violência das guerras e se difundiam ódios entre as nações da Europa. Os casos foram-lhe confidenciados por Ginetta deste modo:
“Um dia, estávamos em casa Gisella (irmã de Ginetta) e eu, quando apareceram alguns soldados alemães. Apercebendo-me que estavam cheios de rancor, pela derrota que já se delineava, sabíamos muito bem do que poderiam ser capazes. Permanecemos, no entanto, calmas e não manifestámos oposição alguma. Naquela ausência de amor, identificámos neles o semblante de Jesus crucificado e abandonado. Colocámos a casa à sua disposição e fomo-nos para o rés-do-chão. Antes, porém, como estava frio, demos-lhes também os nossos cobertores. Na hora, nem percebemos, mas foi justamente esta atitude que nos salvou do pior, porque os soldados, aceitando a simplicidade da nossa oferta, não tiveram coragem de nos fazer mal nenhum”.
O outro episódio sucedeu com a Ginetta. (A humildade de Chiara não lhe permitia contar qualquer facto onde o ela própria representasse qualquer gesto exemplar).
Quando estava para se consagrar totalmente ao seu labor apostólico, teve de o comunicar ao chefe de trabalho que era anticlerical e colaborava no jornal do partido comunista, ‘L’Unitá’. Ela disse-lhe que iria sair daquele óptimo trabalho, sem lhe explicar as razões, o que deixou o patrão curioso. O motivo era para se dedicar ao Movimento que estava nascendo.
Sabendo da sua curiosidade, um dia, convidou-o a visitar a sede onde se reunia o seu grupo. O antigo chefe não se fez rogado e foi, para saber quão importante seria o seu encargo para o trocar pelo trabalho. Ouviu a explicação em silêncio e comentou: “Tudo é lindo, lindo, mas para mim é lindo demais: eu sou um pecador”. Ela retorquiu: “se o senhor pede perdão a Deus e começa uma vida nova, Ele perdoa tudo porque é Misericórdia”.
Pouco tempo depois soube que ele se sentiu impulsionado por uma força desconhecida que o levou à catedral, onde se ajoelhou num confessionário. Demorou aí duas horas. Ao fim, chorava o sacerdote e chorava o penitente que repetia: ‘Aquela Igreja que eu persegui, que eu julguei e até condenei, descobri-a, agora como mãe’: “Assim, – concluiu Ginetta, na sua conversa para as jovens que formava – a misericórdia de Deus vai ajudando a quantos recomeçam sem desanimar”.
É que com Deus tudo é possível, quando se acredita no seu amor e se espera na sua misericórdia.
A história da Igreja, desde tempos mui antigos está repleta de casos como estes: alguns pouco conhecidos, outros tornados públicos, quando realizados com a interferência de grandes santos.