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Como se elege um bispo?

Com a nomeação de D. António Moiteiro, tão conhecido entre nós, para bispo de Aveiro,

nascem de novo as interrogações sobre questões nem sempre conhecidas acerca da eleição de um bispo e da sua nomeação para qualquer serviço da Igreja mormente para dirigir a vida cristã de uma Diocese.
Através dos séculos, nem sempre as regras foram iguais. Já nos tempos apostólicos, vemos Barnabé e Paulo escolhidos, durante uma liturgia na assembleia de Antioquia, a fim de prosseguirem o ministério apostólico e caminharem pelo mundo fora, a anunciar o Reino de Deus. O texto dos Actos não nos elucida os pormenores, mas a regra que a história nos relata vai-nos dando sinais dos usos e costumes posteriores.
Sabe-se que a assembleia cristã, quando necessitava de um pastor, o escolhia ela própria. Uma vez nomeado, solicitava aos bispos das redondezas que realizassem a sua ordenação.
Às vezes, os eleitos, porque se achavam indignos de tal função, ou se negavam a ela ou se escondiam e fugiam. Lembremos S. Martinho de Tours e S. João Crisóstomo, entre outros. Aquele levado do seu mosteiro para a cidade com informação de estar uma velhinha a morrer e precisava receber os sacramentos. Chegado a Tours, onde tudo estava preparado para lhe conferir a sagrada ordem, informaram-no que quem estava sem sacramentos era a Igreja, pois não tinha pastor, há muito. Crisóstomo havia fugido, mas os fiéis, sabendo que não deixaria a mãe por muito tempo, esperaram-no, e uma vez aparecido, cercaram-no, deixando-o livre somente quando consentiu ao seu pedido.
Começaram, nos séculos seguintes, a aparecer casos totalmente distintos: alguns, impelidos pela família, ambição pessoal, ou poderes políticos, eram instigados, sem verdadeira e correcta vontade, a receber o episcopado.
São as pretensões dos homens a misturarem-se nas coisas eclesiais, quando os seus desejos não correspondem à vontade divina. No intuito de pôr cobro a tudo isso, vão surgindo normas, a regulamentar assunto tão capital na vida das Igrejas.
E prosseguiram os tempos com a escolha de algum eclesiástico desejado pelos fiéis. No caso de S. Ambrósio, na altura ainda não baptizado, a aclamação de toda a assembleia que até ao momento se dividia, fê-lo aceitar o pastoreio de Milão, com muita relutância.
Os fiéis reunidos em oração e tantas vezes acompanhada de jejuns, escolhiam muito à-vontade. Mas havia, aqui e ali, ambiciosos de grandezas e poder e logo, por fás ou por nefas, exigiam o título para ele ou seus familiares, e quando tinham muita preponderância pública…
Por isso, nos princípios do século V, o Papa Celestino determinava que nenhum bispo poderia ser imposto a qualquer comunidade de fiéis.
Vieram épocas em que os senhores feudais ou os príncipes e reis exigiram e conseguiram esse intento que ninguém pudesse ser eleito pastor de uma dioceses sem o seu consentimento. Os reis de Portugal obtiveram esse privilégio que, após a República, foi herdado pelo chefe do Estado.
Estes direitos de ingerências dos poderes civis terminaram, no Concílio Vaticano II, que decretou: “Para defender devidamente a liberdade da Igreja e promover mais eficaz e prontamente o bem dos fiéis, o sagrado Concílio deseja que, de futuro, não se continuem a conceder às autoridades civis quaisquer direitos ou privilégios de eleição, nomeação, apresentação ou designação para o episcopado”.
O Código de Direito Canónico pôs em letra de lei tal desejo dos Padres conciliares no cânon 377, explicando que, pelo menos de três em três anos, os bispos de cada província eclesiástica ou conferência episcopal deveriam elaborar, de comum acordo e sob segredo, uma lista de presbíteros que fossem mais idóneos para o episcopado e a enviassem à Sé Apostólica. Quando necessário, o Papa, depois de bem informado, geralmente pelos núncios, nomeia um deles. A redacção do referido cânon é a seguinte: “O Sumo Pontífice nomeia livremente os bispos e confirma os que são legitimamente eleitos”. Esta segunda parte do texto – “e confirma os que são legitimamente eleitos” – refere-se ao poder vindo do costume de algumas dioceses que não os poderes civis intervirem na nomeação do seu bispo. Na Alemanha, na Áustria e na Suíça, segundo uma tradição de séculos, os Cabidos da Catedral ou quem os substitui elegem o seu bispo e enviam o nome do escolhido para ser aprovado pelo Papa.
No Oriente, o Código dos cristãos unidos a Roma determina ser a escolha dos bispos para cada diocese da competência dos Sínodos patriarcais. Após a escolha, enviam o nome do eleito para o Papa. Este ratifica a decisão, geralmente em consistório ordinário.
Naturalmente, nesta questão, a observação do Papa Celestino carregada de bom senso e de lógica seria bem-vinda e desejada para os tempos de hoje cuja mentalidade pretende congregar as vontades de todos e torná-los participantes nas respectivas decisões que lhes digam respeito. Mas, como todos temos visto nas eleições democráticas, difícil se torna obter uma sentença unânime, quando uma grande multidão de pessoas intervém nos votos.
Se os cânones atribuem a nomeação dos bispos ao Papa, devemos saber que não é ele pessoalmente que resolve todos os casos, pois são muitos. Para o ajudar, há a Cúria vaticana que se elucida e pede mais informes geralmente através do núncio apostólico.

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