Nos tempos que vamos enfrentando, à medida que o tempo passa, vamos perdendo os bons costumes.
A palavra dada se não tiver efeitos imediatos deixa de ter o seu valor, uma vez que para qualquer das partes o tempo e as circunstâncias podem desvalorizar a matéria em questão, logo essa mesma parte faz com que se viole o que foi previamente estabelecido e apareça com renegociações ou contrapartidas.
Admirei sempre a palavra na boca dos analfabetos, pois esses como não sabiam pontuar a sua linguagem eram claros nas afirmações, podendo por vezes em caso de dúvidas recorrer-se ao testemunho de alguém que presenciasse. No entanto as querelas entre os analfabetos em assuntos de negócios, foram sempre menores do que aquelas que existem no meio da gente mais envolvida na literacia.
Sempre se fizeram negócios com os pagamentos aprazados sem haver qualquer suporte em papel para evitar as dúvidas onde se primava pela honradez de cumprir sem olhar às oscilações de mercado. O valor que contava era o que era feito à data e hora em que a negociação chegou a consenso, entre o vendedor que pedia uma quantia mais elevada e o comprador que tentava sempre adquirir pelo menor valor possível. No momento em que havia um aperto de mão, esse tornava-se mais válido do que muitas escrituras de hoje, devidamente oficializadas.
O pagar quanto mais tarde melhor e o receber quanto mais cedo possível nos dias de hoje é banal, pois até o Poder instituído foge ao bom exemplo, realizando pagamentos com centenas de dias fora do que foi determinado.
Acontece que quando alguém age à moda antiga, eu pelo menos fico boquiaberto, pois por muito que se cultive a cidadania, os deveres perante o próximo não são focados, fala-se mais nos direitos que a sociedade tem que garantir a tantos, que por sua vez nada garantiram à mesma sociedade onde agora se penduram.
Uma vez aqui chegados, passemos ao mais importante da história. Dois agricultores com idades diferentes, um com mais de cinquenta anos do que o outro, negociaram a venda de determinada quantidade de palha. Este negócio teria acontecido no princípio do verão passado com a condição de ser retirado das instalações do vendedor durante o último inverno. Ora todos sabemos que o inverno que nos deixou foi seco e que o gado não necessitou tanta palha, pelo menos para pernoitar. Aqui surge o comprador unilateralmente a violar as condições combinadas e a não mostrar qualquer interesse com a mercadoria comprada.
O vendedor com noventa janeiros vencidos ficou deveras incomodado, pois a caminho da época quente, com as suas instalações cheias de matéria altamente combustível, sabia bem que era um perigo quanto a um hipotético incêndio.
Em seu lugar alguém se colocou em campo e finalmente aparece quem lhe desocupou a área que o preocupava em matéria de fogo. Aquilo que ao idoso tirava o sono, dois dias bastaram para que tudo se acalmasse e a matéria que tanto servia de forragem como de leito lá seguiu para onde passou a ter a devida utilidade.
Faltava receber, mas para quem vendeu isso não era importante, pois sabia que isso acontecia na melhor oportunidade. Todavia a questão surpreende aquele que escreve estas linhas. Logo na primeira ocasião que me viu, chamou-me e disse-me: – Quero-lhe pagar a palha. Eu respondi mas a mim não me deve nada; entretanto ele continuou, mas faz-me o favor, leva o dinheiro e entrega-o ao seu pai, pois a mim não me tem calhado passar para aqueles lados.
É evidente que não senti dificuldades em fazer este favor, mas dei comigo a pensar no modo de vida de outros tempos, em que se dizia que a dívida é ruim para quem a deve. Hoje ouve-se uma outra filosofia de vida, quem me dever que me pague, a quem eu dever que espere.
E assim me vergo perante a idoneidade de um homem com quem me vou cruzando.