Entrevista: João José Pina Prata – Deputado pelo Círculo Eleitoral da Guarda na XV Legislatura da Terceira República Portuguesa
João José Pina Prata, Deputado pelo Círculo Eleitoral da Guarda na XV Legislatura da Terceira República Portuguesa e actual Presidente de Junta de Freguesia da Guarda, é natural de Moçambique (cidade de Lourenço Marques, actual Maputo). Realizou estudos iniciais em Lourenço Marques, na cidade de Espinho, na Guarda e ainda em Viseu.
Nos tempos livres gosta de ler, presenciar programas de debate, partilhar uma boa conversa e passear.
A GUARDA: Qual o balanço que faz do trabalho como deputado na XV Legislatura da Terceira República Portuguesa?
João Prata: O balanço é necessariamente muito incompleto.
Não é fácil perspectivar o balanço de uma legislatura que tem o seu início em Março de 2022 e o seu final para Setembro/Outubro de 2026 e é interrompida em Novembro de 2023… Mas em Portugal o fim muito antecipado da XV Legislatura não é original. Também outras legislaturas foram interrompidas.
Realizar um balanço destes 20 meses, que incluíram também o debate e votação de um programa de Governo, dois Orçamentos do Estado e, creio, duas moções de censura implica, em certa medida, uma alteração no guião dos trabalhos parlamentares que obriga a uma atenção diferenciada no trabalho dos partidos e dos deputados.
Os debates dos orçamentos do Estado são muito intensos, deveras interessantes e importantes. É um tempo onde, além do “xadrez” político-estratégico e orçamental, os deputados anotam, nas suas intervenções, as plurais dimensões nacionais e transversais das políticas governativas, mas igualmente tocam mais sectorialmente questões de cariz local, do seu distrito, do seu concelho e da sua região.
A saúde, as acessibilidades, a segurança, os investimentos prometidos, as políticas de apoio ao investimento económico nas regiões despovoadas, a presença dos poderes políticos nos territórios em áreas fulcrais para a reversão do despovoamento e apoio à iniciativa privada, o robustecimento da oferta qualificada no ensino superior politécnico, foram áreas focadas no decurso daqueles debates e também no tempo que durou a XV Legislatura.
Os deputados eleitos, e no caso da lista do PSD/Guarda a que tive a honra de pertencer, sabem que são eleitos do País mas, todos eles, e nos seus distritos, promovem o “seu manifesto eleitoral”.
E o PSD/Guarda fez o mesmo com o contributo, desde logo, dos seis candidatos, dos autarcas e da sociedade civil.
E esse “manifesto” é também um bom e indispensável guia para a acção dos deputados no seu dia-a-dia parlamentar a que se acrescenta todo o restante trabalho que, objectivamente, não sendo fácil implementar/desenvolver, tornou-se, em certa medida, inviabilizado pela “precariedade” desta legislativa.
A resposta mais adequada neste contexto é, claramente, afirmar que o trabalho desenvolvido ficou aquém do que inicialmente preconizado.
Poderei acrescentar que subsistiu – e seguramente antes aconteceu – e continuará a acontecer uma preocupação aguda e crítica com os temas da coesão territorial. E valido esta referência para os deputados eleitos pelos diversos partidos nos círculos eleitorais desses mesmos territórios.
É um trabalho árduo por se perceber também que o País é um todo e, cada região/áreas territoriais mais ou menos povoadas/desenvolvidas, tem os seus problemas, as suas “dores” de crescimento e também os seus contributos a prestar.
Para finalizar, importa ainda aduzir que os trabalhos dos deputados não se circunscrevem ao interior do Palácio de São Bento com as questões e intervenções produzidas, sejam de cariz local, nacional e sectorial. Há ainda as perguntas, requerimentos, projectos de resolução e acompanhamento nas Comissões Parlamentares e Grupos de Trabalho temáticos.
Há ainda o trabalho da representação, da intervenção noutros fóruns, contactos com a população e com as organizações de índole social e económica.
É, pois, uma oportunidade aliciante para o desempenho de uma função pública muito gratificante e muito honrosa. E, já agora, apesar do balanço menos positivo, agradeço muito a oportunidade que me foi concedida.
A GUARDA: Nas Comissões Parlamentares que integrou houve alguma medida concreta que tenha apresentado a pensar nos interesses da região da Guarda?
João Prata: Tive o privilégio, na XV Legislatura, de iniciar funções a 1 de Outubro de 2022 após a suspensão de funções do Sr. Eng.º Gustavo Duarte, o único eleito do PSD pelo distrito da Guarda.
Aproveito aqui para deixar o meu testemunho de gratidão pela amizade de décadas, pelo seu saber autárquico e empresarial que podemos e continuaremos a partilhar, pela sua presença sempre bem-disposta enquanto cidadão deste distrito que sabe também estimular a reflexão no encontro das respostas às questões associadas ao desenvolvimento da nossa região.
Iniciei funções “herdando” no parlamento os mesmos lugares que então ocupava o Eng.º Gustavo Duarte. Como efectivo na Comissão Parlamentar de Comunicação, Cultura, Desporto e Juventude. Depois na qualidade de suplente nas Comissões da Administração Pública e Poder Local e, por último, na Comissão Parlamentar da Agricultura e com alguma associação à área do ambiente, da floresta e do ordenamento do território.
Houve e há sempre um “grande conflito” com os horários de reunião e funcionamento das Comissões. Mas, em rigor, estas áreas, tal como a saúde e a educação, sendo esta última decorrente da actividade profissional, são importantes para o nosso distrito, pelo que procurarei participar nas reuniões onde tal fosse possível.
Noutras Comissões, como por exemplo a questão das portagens, também registámos interacções e temas mais candentes para a Guarda foram abordados nas respectivas Comissões e em conversas com outros deputados.
Recordo-me que no início sobreveio a questão da Casa do Douro – agora em debate final – depois as chuvas intensas que trouxeram graves prejuízos nas terras da Mêda e Vila Nova de Foz-Côa, o apoio à construção da residência para estudantes, o que se ia passando pós incêndio na Serra da Estrela, e no momento voltava-se a falar de um estudo que preconizava, outra vez, o encerramento do serviço da maternidade na Guarda para não deixar de abordar outro tema incontornável como seja o custo das portagens e promessas de obras ainda a aguardar a sua “vinda para o terreno”.
Acompanhei com particular gosto o processo de transferência de competências do poder central para o poder local e outras questões associadas a este impactante tema deveras interessante e desafiante para todos os cidadãos e organizações da sociedade e não apenas para os autarcas em funções. A Guarda e o PSD, pela intervenção na altura da negociação com o governo do então edil Álvaro Amaro foram decisivos para a conclusão desse mesmo acordo inicial que teve agora a densificação legal e tem agora a sua implementação no quotidiano das nossas autarquias e comunidades.
Já agora, e permitam-me aproveitar a oportunidade, na comissão que acompanhava as questões da comunicação, junto com outros colegas do PSD e de todos os outros partidos, várias foram as intervenções alusivas à importância de um quadro legal mais favorável à imprensa regional.
Ao quase comemorar 50 anos após o 25 de Abril não é de todo muito positivo o “ambiente” para esse importante motor da liberdade que é a “imprensa local”. Num estudo ali apresentado testemunha-se que neste momento praticamente metade dos concelhos deste país não tem acesso a um jornal local e a comunicação social local debate-se com maiores dificuldades e recorde-se que nos últimos dias do ano soube-se que jornalistas e outros intervenientes num grupo de comunicação social, proprietário de dois jornais e uma estação de rádio não tiveram salários pagos. Mais, em 2023, registaram-se as primeiras greves de profissionais da comunicação social.
Já não vão chegando as palavras, mas sim precisam-se efectivas políticas de valorização desta importante actividade fulcral em qualquer regime democrático. E uma palavra forte para os cidadãos da nossa comunidade façam-se assinantes dos nossos órgãos de comunicação social.
No âmbito das Comissões Parlamentares realizámos várias visitas e inclusive no nosso distrito com a participação dos deputados eleitos pelo distrito pelo PS -António Monteirinho e Cristina Sousa- pudemos testemunhar não apenas o que se fez mas também o que é necessário ser ainda realizado.
A GUARDA: Apesar do trabalho feito ainda há muito mais a fazer em termos de discriminação positiva das zonas mais desfavorecidas?
João Prata: Sim, há muito, e ainda bem, que tiveram responsabilidades governativas, a fazer para o país na temática da coesão territorial. E reconheça-se que os principais partidos fizeram bem e também menos bem nesta importante dimensão das políticas públicas.
Disse-o na Assembleia da República, como outros o poderiam dizer, foi com o movimento da vinda dos “retornados” e depois com a instalação do ensino superior politécnico -recordemos o que decidiu o antigo regime com a abertura de algumas universidades nas cidades do interior no ano de 1973 pela mão de um ilustre celoricense de nome Veiga Simão e hoje estão a celebrar o seu cinquentenário e a sua importância no tecido dessas localidades e, claro, para a coesão do país – que as nossas regiões encontraram subida de população, diversificação da actividade económica, exigência e reivindicação, qualificação e participação mais activa.
Não embarco muito na lógica de afirmar que nada foi feito e o que foi feito quer nos governos do PSD mas também nos governo do PS seja tudo menos bom mas ultimamente não têm conseguido um resultado tão visível como o que referi em relação aos dois movimentos enunciados.
Sem querer ser “dono da verdade” também é importante sermos mais ousados no nosso modo de reclamar, de exigir, de propor e melhor conduzir as questões para a decisão final.
Uma das mais valias na Assembleia da República é também poder verificar o que noutros círculos eleitorais vai-se fazendo e pensando mesmo considerando as naturais diferenças político-partidárias.
Mas precisamos no que se refere aos principais sectores produtivos da região uma melhor presença do estado para auxiliar e não para burocratizar a vida de quem quer produzir e empreender.
Precisamos que as acessibilidades, muito desenvolvidas sem dúvida no tempo democrático, fiquem concluídas as que ainda estão em obra e andam a passo de “caracol” e noutros casos saiam do papel que só são acenadas em tempo eleitoral.
Precisamos de um poder local mais vocacionado para as novas políticas de fixação de pessoas, de empresas, de valorização económica dos recursos endógenos e um maior mundo para as nossas terras. Recordo-me da resposta do poder central aquando da entrada na então CEE e dos primeiros fundos foi necessário apoiar os municípios no aproveitamento desses mesmo fundos e das políticas comunitárias por via da criação dos GAT- gabinetes de apoio técnico. Por muito que me entusiasme a criação das CIM’s não creio estar só aí a resolução para as novas políticas locais.
Precisamos de pensar, de envolver, e de agir com a noção de que as saudáveis querelas devem servir para multiplicar os esforços de convergência e não apenas para dividir e paralisar.
Precisamos em cada política sectorial governativa fazer ouvir a nossa especificidade e precisamente porque o país é pequeno mais facilmente esta óbvia atenção deve estar presente em quem nos governa e a quem compete recordar esta circunstância porque a diversidade territorial é um efectivo que produz o seu efeito em quem tem de decidir questões muito críticas.
Precisamos que a representação política possa ser maior, que as entidades associativas de cariz sindical, empresarial, cívica e de outra índole -incluo aqui por facilidade os partidos políticos- possam robustecer-se de modo a que mais fortemente tenham melhores condições para interferir no processo decisório.
A GUARDA: A legislatura foi interrompida a meio. Como olha para a actual situação política do País?
João Prata: Olho e vejo menos bem para o que se passa no país político com todas as suas implicações na dinâmica da vida dos cidadãos e das organizações.
Não querendo porque não o sou – catastrofista- podemos estabelecer uma comparação com uma barcaça a ser “desconduzida” e a cada remo a apontar a cada direcção, um pouco uma orquestra desafinada no tom e na melodia reclamada e esperada.
Permitam-me chamar aqui não só a qualidade de militante do PSD e dizer, de forma redonda e breve porque assim impõe a extensão da folha do jornal, que desde 2015 até ao dia de hoje o nosso país perdeu muito do esforço que se fez até aí, não obstante, quererem afirmar o contrário, e esconder o que antes aconteceu com maior ou menor responsabilidade dos incumbentes de então. A verdade é que o país foi sujeito a um regaste e essa circunstância obrigou-nos a reagir…
Vivemos depois um momento, 2019/2021, em que praticamente só o calculismo político-partidário contou e depois um segundo momento 2022/2023 que foi de facto, e sem grande distanciamento a que a História obriga, um descalabro político e social muito preocupante. Nem é preciso conversar da aceitação eleitoral maioritária por isso da confiança traída, da quantidade de demissões dentro de um governo de maioria absoluta, o rocambolesco episódio na casa da execução governativa, para percebermos a gravidade do tempo político que vivemos e da ausência de projecto de desenvolvimento e convocação dos cidadãos que o PS trouxe nestes últimos anos.
Indistintamente das escolhas eleitorais de cada um, a 10 de Março e depois a 09 de Junho e espero que o sintamos como uma obrigação e um dever/direito conquistado, não vai ser fácil reganhar a confiança dos portugueses logo no ano em que celebramos, e devemos fazê-lo, o cinquentenário do 25 de Abril de 1074. Mas sabemos que temos todos os dias para emprestar mais vida à Vida que nos sendo outorgada merece ser vivida e é-o tão mais vivida quanto mais participada for. E reganhar a confiança para um projecto de comunidade, de país é o bastante para nos desafiarmos a alterar politicamente pela escolha eleitoral que cada um deve realizar.
A GUARDA: Como analisa a tomada e posição da Concelhia da Guarda do PPD-PSD, em relação à escolha dos candidatos às próximas eleições legislativas e o que o levou a pedir para que o seu nome fosse retirado da lista?
João Prata: Em relação à escolha dos candidatos a deputados pelo meu partido reafirmar que tiveram, têm e terão o meu apoio, a minha colaboração se assim o desejarem e conto estar em diversas ocasiões e momentos com cada um deles. Continuarei como é óbvio a ser militante da minha terra e do PSD. E numa e noutra circunstância emprestarei o que puder e souber para reforçar a actuação dos eleitos procurando também aprender mais sobre o muito que me falta e faltará sempre. Os candidatos do PSD são uma mais valia pela sua experiência, pelo seu conhecimento e pela sua abnegação nas causas em que sem envolveram e agradeço por isso o seu interesse e disponibilidade em prosseguirem na casa maior da democracia.
Manifestei de facto a minha disponibilidade para continuar a integrar a lista de deputados, em que lugar fosse possível pois que em alturas anteriores fiquei já em último, no quarto lugar e até no segundo lugar. Mas, e apesar de alguns apoios, verifiquei que não foi cumprida uma palavra a qual tinha importância para reunir as condições políticas e não fragilizar a presença na lista, em qualquer lugar que fosse, volto a enfatizar, e a própria lista no seu todo.
A GUARDA: E a partir de agora, como vai ser o futuro político de João Prata, vai ficar apenas pela Junta de Freguesia da Guarda ou tem outras aspirações?
João Prata: Como até aqui, e agora nas condições que anteriormente me encontrava, vou continuar na freguesia da Guarda com muito gosto e um particular agradecimento aos meus colegas e aos funcionários da freguesia e muito particularmente à generosa confiança dos cidadãos da Guarda que nunca jamais saberei convenientemente agradecer para além de tentar fazer mais melhor e diferente.
No que ao meu futuro político é referido na pergunta só mesmo o tempo cuidará de moldar a melhor resposta. Nunca escondi que respeito e tenho gosto pela vida pública, mas também aprecio a minha actividade profissional que é a docência.
A GUARDA: Como avalia o voto do PG na Assembleia de Freguesia da Guarda que permitiu a aprovação do orçamento?
João Prata: O PG foi coerente com o percurso que vem fazendo na assembleia de freguesia da Guarda.
Optou pela abstenção nas votações no orçamento e no plano de actividades nos anos de 2022, 2023 e agora para o ano de 2024.
Agradecemos e apreciamos essa opção pela “viabilidade condicionada” no exercício do desempenho do governo da freguesia.
No cumprimento do estatuto da oposição, e mesmo nos anteriores mandatos quando o PSD estava em maioria, acolhíamos, como agora, as propostas que possamos concretizar sejam provenientes dos partidos que estão na oposição na assembleia de freguesia, pela auscultação que vamos fazendo na comunidade e também no diálogo que vamos tendo com os eleitos do PSD.
O PG tem vindo a considerar que não deve disponibilizar um voto favorável/ um “cheque em branco” e também não deve emprestar “fogo à peça” e no balanço realizado não deixa de reconhecer os aspectos positivos e os menos positivos e também não deixa de apontar o que realmente alteraria se tivesse a oportunidade de governar a freguesia. É uma posição que observo e à qual atribuo a nota de oposição construtiva e conta por esta via realizar o seu percurso autárquico até ao final do mandato.
O PG foi compreensivo com o esforço que desenvolvemos nestes últimos quatro anos em que tivemos um sobre esforço financeiro para corresponder ao conjunto de investimentos realizados no edificado da freguesia. E, por isso, outras opções do próprio governo da freguesia, mas também do PG, não puderam ter o vencimento devido e nuns casos, até com acuidade reconheça-se, mas não era economicamente possível corresponder.