Igreja

A cada ano terminamos o tempo litúrgico com a Solenidade de Cristo Rei do Universo. Esta festa é um desafio a perceber o tipo de realeza de Jesus. O povo hebreu, durante séculos, não sentiu necessidade de ter reis. Descendente de povos nómadas, de linha tribal, não tinha esta tradição. Mesmo quando, percebendo a realidade política dos povos vizinhos, via vantagem neste tipo de organização hierárquica, os profetas iam instruindo o povo de que apenas Deus deveria ser o seu rei. Só no tempo de David, como nos é sugerido na primeira leitura, é que as doze tribos de Jacob passaram a ser um grande povo, ao ponto de o reinado de David ter alcançado uma tal grandiosidade que nenhum outro sucessor foi capaz de igualar. Por isso, os hebreus esperavam ansiosamente um outro grande rei que devolvesse o esplendor e o poder de outrora ao pequenino rebanho de Israel. 
 
E assim, durante séculos, em Israel, foi-se desenvolvendo o messianismo. O povo pedia insistentemente a Deus um rei como David. Com as sucessivas invasões de povos guerreiros, muito mais fortes e organizados, o consequente domínio estrangeiro, a perda de autonomia e a dificuldade em viver as suas tradições culturais e religiosas, todos os judeus aguardavam com expectativa e ansiedade a chegada desse grande rei. Quase se tornava uma obsessão. E era alimentada pelos profetas que anunciavam a vinda do Messias. É neste contexto que surge Jesus de Nazaré. A profecia cumpre-se nele, sendo, inclusive, descendente de David por parte de José. Mas desde o início que os contornos da sua vida eram muito diferentes daqueles que os israelitas esperavam do messias. Nasceu pobre numa gruta de Belém, sem os confortos dos palácios e a guarda dos exércitos. Morreu numa cruz como um criminoso, escarnecido e abandonado por todos.
 
Que Messias é este, afinal, e que realeza é a sua? Onde está o seu trono, o seu poder, a sua nobreza, a sua glória? A sua realeza é bem diferente das realezas deste mundo. O seu trono é uma cruz. O seu poder manifesta-se no amor e no perdão que concede até aos seus algozes. A sua nobreza é o serviço, pois Ele veio “para servir” (Mt 20, 28) e dar a vida pela nossa redenção (Ef 1, 7). A sua glória é fazer a vontade do Pai (Jo 6, 39). E a vontade de Deus é que, pela Sua morte e ressurreição, Jesus vença o pecado e a morte, todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade (1 Tim 2, 4). Os israelitas estranharam este tipo de realeza. E hoje, provavelmente, continuamos a duvidar dela e a questionarmo-nos sobre Jesus. Como João Baptista ainda perguntamos: “és Tu o que está para vir, ou devemos esperar outro?” (Lc 7, 20).

Senhor Jesus, o mundo continua a ter dificuldade em perceber e aceitar a Tua realeza. Muitos cristãos prefeririam uma realeza que se manifestasse pela força, o poder, a honra e a glória à maneira humana. Mas Tu reinas a partir da cruz, do serviço, do perdão e do silêncio. Faz da tua Igreja reino da paz. E de mim, teu humilde servo, testemunha dessa realeza que se manifestou plenamente no Calvário e na manhã da Páscoa.
Amén.

 

Neste penúltimo domingo do ano litúrgico, ouvimos uma exortação de Jesus que não perde a actualidade:

A liturgia deste domingo coloca-nos diante do mistério da vida e da morte.

Lucas apresenta-nos hoje o encontro de Jesus com Zaqueu, um ‘homem rico’ que ‘era chefe de publicanos’.